sexta-feira, 27 de maio de 2011

Personagens Femininas do livro Vestígios dela e outras histórias, de Saul Melo.



Nunca ouvira falar de Saul Melo até receber de presente de um amigo o livro Vestígios dela e outras histórias. Como gosto de contos, li a obra, que descobri ser a sua primeira (que venham mais!) e que me levou a uma reflexão prolongada sobre a realidade que me cerca. Às vezes, acredito que “nada acontece por acaso”, como dizem, porque me surpreendeu Saul com os seus contos em muitos aspectos: a descrição de locais (impossível não desenhá-los na imaginação, não se integrar neles), o dinamismo, a linguagem, os finais inusitados, as metáforas, as narrações sem pontuação (como quem fala de atropelo, movido pela emoção, sem pensar), em alguns deles, a maneira de narrar em diálogos com o leitor; mas principalmente suas personagens, delineadas com clareza, psicologicamente bem montadas, e dentre elas as mulheres, porque a impressão que me ficou é que elas têm vida própria, independente do narrador, são notáveis, fortes, umas delas amores platônicos (ou nem tanto) de adolescentes, que permaneceram na imaginação de homens feitos:

Logrou a minha simpatia a quieta Daguimar, que, trocada por outra, depois de ajudar o marido a recuperar a alegria de viver, toda depositada em seu sorriso perdido numa briga, expulsa de casa, levou consigo a felicidade que devolvera ao homem com quem vivia: sua dentadura;

Pensei em quantas Maras existem soltas pelo mundo. Com um filho adolescente, apaixonado por ela (o menino não superou o complexo de Édipo. Freud explica?) fez de tudo para se tornar feia: engordou, começou a vestir-se mal, deixar de se pintar, de se arrumar, mas mesmo assim ele não se desinteressou por ela (“-Agora estás bem como eu gosto, mãe...”). Imaginei o espanto da mãe...

Amanda, corajosa ao romper um relacionamento que se arrastava e não mais a satisfazia;

Leonor, diante da qual ele (sem nome) ficava petrificado, enquanto sua imaginação adolescente percorria o corpo da jovem (ela menos inocente que ele);

Alice, do conto “Lembranças cruzadas”, narrado em 2ª pessoa (fugindo das características da narração), que prestou um concurso em Brasília, levada pelo tédio, e assumiu o seu cargo, aliviada por não ter mais que fingir uma felicidade que já não sentia com o marido;

Fiquei com pena de Maria, vendida por quem deveria protegê-la e, quando encontrou o amor, impedida de ser feliz por homens preconceituosos, incapazes de respeitar os sentimentos;

Ah! e Eurídice, fascinante, “olhos enormes, longos cabelos soltos,” amor platônico vivido com intensidade e sofrimento pelo puro menino de fazenda, cujo coração batia descompassadamente enquanto a contemplava maravilhado. Foi a primeira perda amorosa, o que o levou a chorar e lembrar-se dela cada vez que um amor morria;

Cativou-me Anita na sua mudez, na sua dor, ensimesmada, depredada como a paisagem que a cercava: o rio barrento, as margens sujas, o banco podre, onde sentava todos os dias ao anoitecer, até que o marido a levava para casa.

Todas elas deixaram na alma dos homens que passaram por suas vidas, indeléveis vestígios.





Mardilê Friedrich Fabre


Imagem: Google

sábado, 21 de maio de 2011

Redesenho-me



Foram muitas as vezes que me redesenhei.

Era menina tímida e sonhadora, interiorana, protegida pela família.

Interna em colégio de freiras na capital, vi-me, de repente, sozinha, conquistando meu espaço.

Depois de três anos, era outra, embora sonhadora (ainda o sou), agora impulsiva, determinada, segura, persistente.

A perda prematura de minha mãe, amadureceu-me à força, principalmente porque havia minha irmã menor.

No trabalho, a dedicação tornou-me profissional respeitada.

Como mãe, sempre me preocupei em legar bons exemplos.

Uma grave doença mostrou-me uma faceta diferente da vida e passei a valorizar as pessoas, a compreendê-las, a dar-lhes atenção, a aceitá-las como são. Entendi que até então tinha sido um rascunho de mim.

Com a maturidade, contenho o meu lado explosivo com mais facilidade, ouço quem me procura, observo mais e opino menos, afinal somos indivíduos, portanto diferentes, com personalidades distintas.

Aprendi que o erro é característica do ser humano (quem não erra?) e que perdoar não é esquecer, e sim ter a humildade de aceitar essa peculiaridade, que é inerente às pessoas.



Mardilê Friedrich Fabre

Imagem: Google

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Pobre Povo!



Sequestrados em sua terra.
Maltratados, ultrajados
Negros, que a vista descerra
Maltrapilhos, mutilados...

Escravizados por mãos
Impiedosas, insaciáveis...
Surrados. Pobres irmãos!
Direitos? miseráveis.

Do negro, povo humilhado,
Albergaram-se hartos rastros
(como quem grita calado)
Na rotina e nos cadastros.

A crença modificada
Chegou até o senhor.
Agora é afiançada
(Quem diria!) por doutor.

Vítimas de preconceitos,
Relegados à sarjeta,
À pobreza são sujeitos.
O que lhes resta? Escopeta?



Mardilê Friedrich Fabre

Imagens: Google

sexta-feira, 6 de maio de 2011

MÃE


Mãe, não estás mais comigo.
Sem ti, meus passos sigo.
Mas como dói a saudade
Da tua simplicidade!

O tempo, fiel parceiro,
Dos meus caminhos luzeiro,
Não diminui a tristeza
Da tua falta e firmeza.

Guardo n´alma o teu retrato,
Que em mim permanece intato.
Deus te refugiou na graça,
Defendeu-te da desgraça.

Mãe, ensinaste-me tudo.
Diante do teu olhar mudo,
Do teu sorriso imortal,
Agradecer-te é surreal.

Dentro de mim trago a luz
Que ao infinito conduz.
Espero um dia seguir-te
E da tristeza excluir-me.

Em tua vida, me guio,
Tua constância copio.
Tu és meu fio condutor.
Hoje dou-te meu louvor.

Barrinhas e Divisórias

Mardilê Friedrich Fabre