Em
seu escritório improvisado, a professora corrige redações. Oito turmas de
terceira série, e o vestibular à porta, é preciso que os alunos escrevam
melhor...muito melhor.
De
longe, distraída que está, ouve a campainha. “Ué! Não espero ninguém”.
Vai
até a porta e abre-a. Diante dela, o rosto conhecido de um adolescente tímido,
muito triste. Seu olhar fala: “Me ajuda”.
Surpresa
e também curiosa, convida-o a entrar e sentar. Apesar do seu esforço, tem um
pouco de dificuldade de fazê-lo falar para contar o que o aflige tanto.
Para suavizar o ambiente, depois de ele
concordar, coloca no aparelho um CD do Chico Buarque (ele lhe diz q é um de
seus cantores prediletos). Só então a conversa começa a fluir com mais
naturalidade (desaparece a surpresa dela e um pouco da timidez dele).
De cabeça baixa, como quem esconde o rosto,
ele chega ao ponto crucial. (“Como ela não percebera? Só podia ser isto: amor
não correspondido. Amor de adolescência... Também ela fora escandalosamente
apaixonada por alguém. De chorar de frustração. Ele a ignorava completamente. E
como doía!”)
E o que dizer para aqueles olhos à sua
frente voltarem a brilhar confiantes de que o amor é possível? Adianta afirmar
que, com o tempo, tudo passa?
Ela deve apenas ouvir a história, embalada
pela voz do Chico, e revelar seu otimismo em viver. (“Vontade de dar-lhe colo e
deixá-lo chorar até livrar seu peito de tamanha tristeza. Foi o que a ajudara.”)
Ele vai embora e fica com ela uma sensação
de impotência nostálgica.
Ele volta (ainda bem, porque ela está mais
preparada). Ele lhe parece mais animado, um pouco menos triste e conversam
sobre assuntos diversos. A filha dela contribui para distrair o ambiente, pois
vem do balé, entra como um furacão, larga a mochila e sai aos pulos para
brincar na calçada.
Mas... e na sala de aula? Ela percebe que
ele a segue com um olhar súplice.
É. A relação aluno-professora fora rompida,
porque agora entre os dois surge um novo e precioso sentimento: amizade.
Mardilê Friedrich
Fabre
Imagem: via Google
Um comentário:
Estes amores não correspondidos sempre permitem algum sofrimento. Celso Ferruda
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