sábado, 15 de janeiro de 2011

Crônicas

Folhetins 



Os folhetins nasceram na França, em meados do século XIX. Eram publicados em capítulos, em jornais. Chegaram ao Brasil, traduzidos do francês. Muitas vezes, mal traduzidos, o que motivou Joaquim Manuel de Macedo a escrever A Moreninha, romance baseado na realidade brasileira,  também em capítulos para jornais, exemplo de folhetim mais popular do Brasil. Aliás, muitos de nossos escritores começaram publicando suas obras em folhetins: Joaquim Manoel de Macedo, José de Alencar, Manuel Antônio de Almeida, Machado de Assis, só para citar alguns.

É preciso ressaltar que os jornais tinham interesse neste tipo de entretenimento, porque aumentava suas vendas.

Com o advento do rádio, os folhetins dos jornais desapareceram. Mas o rádio importou a ideia e criaram-se as radionovelas. Algumas eu acompanhei. Lembro-me nitidamente de uma O direito de nascer, um dramalhão cubano (Felix Caignet), levado ao ar no horário nobre do rádio, 20h, pela Rádio Nacional, que durou seguramente mais de dois, cujos personagens, Albertinho Limonta, Isabel Cristina e Mamãe Dolores levavam o público feminino (sim, porque “novela era coisa de mulher”) às lágrimas quase todas as noites. Ela foi adaptada para a televisão e teve o mesmo sucesso que no rádio. Nós, crianças, quando nos permitiam ouvi-la, não podíamos dar um pio, silêncio absoluto.

Lembro-me bem do rádio em lugar de honra na sala das casas. Ao redor dele, as mulheres bordando ou fazendo crochê ou tricô. O pior era quando estava no “bom da novela” e começavam os chiados, os ouvidos colavam-se ao rádio e eram comuns exclamações, como “logo agora!”, “assim não dá”, “vamos perder o melhor”.

Na década de 1950, recordo-me de uma Revista chamada Grande Hotel, que publicava fotonovelas, mas que não teve a aceitação da radionovela. Nesta década também entrava nos lares do Brasil, tomando o lugar do rádio, a televisão, e com ela a telenovela, que desbancou a radionovela, tornando-se o tipo de entretenimento preferido dos brasileiros, a ponto de o Brasil (leia-se Globo) ser o melhor produtor de novelas para a televisão do mundo.




Mais um final



Mais um folhetim televisivo da Globo chegou ao final. Uma verdadeira apologia à amoralidade.

Eu não acompanho as novelas diariamente, porque a repetição da maldade, da trama de ricos e pobres que se entrelaçam, a monotonia do bem derrotado, triângulos amorosos imorais e amorais, bons ingênuos e crédulos, maus espertos e inteligentes, capazes de tudo (enganar, fingir, roubar, matar) para alcançar seu intento, geralmente ganhar dinheiro fácil e poder, vinganças sem sentido, me cansam, me incomodam. Assisto aos últimos capítulos, quando os vilões são punidos. No entanto, nesta última novela o autor se superou em impunidade e mortandade, casamentos inesperados, relacionamentos insólitos e o mal vitorioso em close na telinha.

Os autores querem colocar em evidência problemas que grassam em nossa sociedade doente, como discriminação, pedofilia, drogadição, roubo, assassinatos, vingança por motivos fúteis, mas o mal fica tanto tempo em evidência que a punição, quando acontece, não suplanta a impressão negativa que marcou os telespectadores. Isso sem contar que os atores se superam quando protagonizam vilões. Sua atuação é impecável, surpreendeu-me até em Passione o Gianecchini. Em algumas cenas, conseguiu me convencer. E os bons? São monocórdios, aqueles águas mornas, claro com exceções de atores já consagrados, quase todos, diga-se de passagem, vindos do teatro.

Neste mundo violento e trágico, a vida se encarrega de tramar sua própria novela, por que perder horas de lazer diante da telinha para ver desgraças? Não seria hora de algum renomado autor se aventurar a escrever uma novela em que o bem fosse a tônica, como naquelas das décadas 1950, 1960, convidando atores, que se dispusessem a interpretar personagens sem desvio de caráter, e colocar no ar? Não precisamos nos entreter com desgraças e maldades. Criar personagens como Candê, humana, que conhecia o filho, mas o amava; como Bete, que respeitava a família e a aceitava como era; como a Estela, mãe, não a que enganava o traste do marido com homens que nem conhecia (era necessário isso?), mas a mãe, que apoiou o filho na hora que ele precisou; famílias unidas contra o mal. E também que os maus não sejam gratificados com uma boa vida numa ilha paradisíaca do Pacífico. Por favor! Isso não é o mesmo que dizer: Vejam, “o crime compensa”. É só ser experto o suficiente para usar as pessoas e safar-se, e ainda dar uma mãozinha para condenar alguém por um crime que não cometeu (a bem da verdade nem tão inocente). O telespectador quer que o crime seja punido, haja vista a audiência que teve a novela no capítulo da prisão de Clara, mais de 50%.

O dinheiro e o poder comandam o crime e a corrupção, e os traumas de infância justificam o desvio de caráter. Isso até pode acontecer na vida real, mas para isso existe tratamento. Novela é uma obra de ficção! Não é o que dizem? Então por que não levar ao ar um folhetim que não incentive as maldades e falcatruas, desvendando-as e punindo-as no desenrolar da trama, durante os mais ou menos seis meses  de sua duração, tendo, lógico, as suas, consequências, e não deixar isso só para os últimos capítulos, a fim de  deixar a  lição de que realmente  “o crime não compensa”.



Mardilê Friedrich Fabre

Imagens: Google





Um comentário:

mariaclara disse...

Mardilê, adorei tua colocação quanto as novelas que atualmente o povo brasileiro assiste.Infelizmente estamos tão acostumados a ver só desgraça em todos os lados,na saúde,na
educação, na política, na natureza que me parece não haver mais solução. Estão matando a esperança,o amor. O que ocorre de bom é muito pouco publicado.O que os melhores canais de televisão e jornais de maior circulação nos informam ? Onde vamos encontrar as soluções?
Até os amigos mudaram.Agradeço o teu apoio. Fiquei feliz com tuas palavras. Com certeza não vai ser facil criar algo para o bem. Nós ainda tenhos esperança!
Carinhos