Sob a lona
do circo, a expectativa
para o início
do espetáculo era
grande. Foram vários
dias de propaganda
e espera. Muito
se falou sobre os artistas
e suas habilidades.
A montagem do picadeiro
e da lona foi acompanhada com interesse, principalmente pelas crianças.
A toda a hora,
meus filhos
vinham com uma novidade:
“Mãe,
falei com o palhaço.
Ele é um
homem normal.”
“Mãããe, vi a
roupa do trapezista.
É vermelha, bem
justinha, cheia de pedras
que brilham”.
“Mãe, fizeram uma pista
redonda. Penduraram umas varas. Disseram que
é onde os trapezistas
vão se apresentar”.
“Mãe, estou louco
que chegue o dia.
Vai ser a primeira
vez que
eu vou ver um circo!”
Finalmente, chegou o dia.
E lá estávamos nós
na primeira fila.
Olhinhos inquietos fixos no picadeiro. Não
queriam perder nada.
Primeiro, entrou o apresentador:
“Senhoras e senhores,
apresentamos o maior espetáculo
da Terra”...
Todos os circos
do mundo apresentam o maior espetáculo da Terra. Só que as crianças
não sabiam disso. Vieram os palhaços, dando cambalhotas
no ar, fazendo soar gargalhadas de todos
os lados com suas
trapalhadas.
Em seguida,
apresentaram-se três jovens com brilhantes vestimentas
vermelhas. Subiram pelas escadas de cordas suspensas e dirigiram-se para
os trapézios. Seus
corpos voavam no ar,
saltos duplos,
saltos triplos.
Seguravam e soltavam os trapézios.
Saltavam, giravam e seguravam-se nas mãos
de um deles, pendurado
em um
trapézio imóvel.
Perpassava um calafrio
em nosso
corpo ao ver aquilo. Eram verdadeiros bólidos
movimentando-se no ar. Quando terminaram sua
apresentação, o público
aplaudiu-os em pé.
Sucederam-lhes
os malabaristas. Atiravam argolas para o alto. Aparavam com
os braços, com
as pernas, com
a cabeça. Um
deles subiu nos ombros
do outro e um
terceiro nos
ombros deste, sempre
atirando as argolas para
o alto e aparando-as.
Chegou a vez da menina equilibrista, que
dançou em um
fio de arame.
Exibiu-se também um mágico que
encantou com os seus
números tão
perfeitos que
dava a impressão de que
tudo era
verdadeiro. As crianças
acabaram acreditando que o coelho saiu da cartola,
que ele
cortou a mulher pelo
meio e que
tirou moedas da orelha
do amiguinho de meu filho.
A contorcionista fez do corpo
o que quis: colocou a cabeça entre as
pernas, rolou como
uma bola pelo
chão...
E o espetáculo das águas
dançantes coloridas ao som da valsa Conto dos Bosques de Viena, de Johan Strauss, então? Deixou todos
com vontade
de ver mais,
e mais, e mais.
Durante dias,
o assunto foi o circo.
Ainda mais
duas vezes fomos assistir
ao espetáculo. E era
como se as crianças
o vissem pela primeira
vez. Até
tive a impressão de que
a atenção era
redobrada, porque, além
de ver, queriam aprender como se fazia. Minha
orelha ficou vermelha
de tanto quererem tirar
moeda dela. O balanço
virou trapézio. Um
dia impedi, na hora,
um deles tentando andar
no arame de pendurar
roupa com
a minha sombrinha.
Minha filha
caiu, quando tentava subir
nos ombros
do irmão para
fazer malabarismos...
Até que,
como tudo,
o circo deixou de ser
novidade e caiu no esquecimento,
sendo substituído pelo filme
do super-homem, que
entrara em cartaz no cinema.
Mardilê Friedrich Fabre
Imagem: Google