sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Cenas de vida




Na grande tela da memória,

Reavivo minha longa trajetória.

Após a chuva, pés nas poçaságua,

Menina travessa, sem mágoa.

Adolescente, na praça, o beijo roubado

E um rosto em brasa, corado.

Estudiosa, da mão do docente

O diploma recebo contente.

De branco, caminho fitando o altar.

A Ave-Maria me guia para casar.

Entro no hospital comovida,

Recebo de presente uma vida.

Com inveja a nuvem negra vem,

Fere-me o coração. Reajo, porém.

Surpreendo os fantasmas passados.

Com coragem, encaro dias embaçados.


Mardilê Friedrich Fabre

Imagem: Google

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Viver




No céu laranja-avermelhado,
O sol desaparece lento.
Vozes de criança são alento.
Esquecido, volta o passado.
Sou eu na calçada da vida.
De mãos dadas com a inocência,
Num momento de confluência,
Retorno à infância florida.
Rodar ao som da melodia,
Cantata pura, cristalina.
Encharcar-me na chuva fina,
Enquanto o mundo sorria.
Planar nas nuanças da luz,
Conservar os braços abertos,
Ouvir os corações despertos,
Sair do vácuo, contraluz.

Mardilê Friedrich Fabre
Foto: Marilene Friedrich Lobo D´Ávila

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Presente de todos os dias


 

Recebo todos os dias

Um presente: a aurora.

Ela chega rosicler,

Trazida pela brisa airosa.

Move-se na cadência

Da orquestra dos pássaros.

Vem de mãos dadas com o sol.

Dissipa os segredos da noite,

Desfila sua beleza natural,

descanso à lua e às estrelas,

Desperta as flores banhadas de orvalho,

Ilumina a vida insípida,

Traz a crença

De que a essência é boa,

Basta dar ao tempo chance

De revelar a magia que encerra.

 
Mardilê Friedrich Fabre
Imagem: Google

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

O Pintor



Todas as manhãs, vejo-o do meu quarto do hotel. 
Chega solitário, cabelos longos, chapéu, calça jeans, camiseta, carregando seus inumeráveis apetrechos. Arma-os sem pressa e inicia seu trabalho. Sua mão desliza num vaivém meticuloso. Seu olhar deve descobrir detalhes além daquelas fachadas antigas e desbotadas. 
À noite, encontro-o por casualidade numa feira de artesanato. Paro ante sua banca. Sorrio. Ele me retribui o sorriso. Não tem a menor ideia de quem eu seja ou por que sorrio. Atrás dele, quadros de casarios antigos com traços modernos: uma mistura de tempos. Não são meras reproduções. Há algo mais neles: um traço forte, corajoso, cores vivas. Um me atrai particularmente. Representa o cenário que descortino do meu hotel. Compro-o. Sorrindo, afasto-me. Olho para trás e ainda vejo seu semblante. Diferente sem chapéu. 
De manhã, está ele, e eu arrumando as malas. Vou sentir saudades, mas levarei comigo a terna visão do pano de fundo que escolhi para beber do meu silêncio.



Mardilê Friedrich Fabre

Imagem: Google

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Engano a solidão





Emoção singela

Faz recuar minha dor.

Por ti ,ó donzela

Desperdicei a cautela,

Tornei-me pelejador


Não é faz de conta o mundo

Forja a vida em nó profundo.


Marcas do passado

Estão vivas no presente.

Lembro o teu nublado

Olhar deveras molhado

Pela saudade nascente.


As lembranças afugento

Do meu tolo pensamento.


Há graça nos dias

Que correm de pés descalços

Pelas fantasias

Das poças só de alegrias

E dominam os percalços.


De ti preencho o vazio,

E a solidão ludibrio.


Mardilê Friedrich Fabre